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Quirino Campofiorito

 

De todas as euforias artísticas no Brasil, a da gravura gráfica de criação é a mais justa. Em seguida a um demorado processamento de iniciação, quando atuam uns raros nomes de gravadores (Carlos Osvald e Oswaldo Goeldi), a gravura com o rigor de criação realmente se impõe com a geração que emerge na década de 1940. Não cessa, então, de crescer, até alcançar uma quantidade deveras excepcional, que extravasa os limites nacionais e chega à mais decidida notoriedade internacional.

 

Nossos gravadores, formando uma equipe que se tornou assaz numerosa, conseguiram merecida posição de grande singularidade no conceito mundial. A gravadora Lêda Watson está nessa linhagem que hoje bem sustenta, para a gravura brasileira, esse destaque. Reconhecendo-se isto, logo se deverá apreciar a gravura com seus melhores requisitos de uma particularidade da criação artística que sustenta suas condições próprias e cujo sucesso total delas decorre. O desenvolvimento da inventividade artística exigiu, porém, liberdade para o surgimento de novos recursos de elaboração criativa que, se bem muito adaptados ao trabalho gráfico (e, consequentemente, afins ao ofício do gravador), escapam ao que se possa classificar, com um mínimo de propriedade, de gravura. Lêda Watson dá provas de fidelidades à gravura.

 

Seu trabalho prossegue com o compromisso que sua arte impõe: gravar. Algumas interferências são fortuitas e não afetam a legitimidade da gravura. É uma gravura que comove e se comunica pela transposição emocional e criativa da artista, fazendo valer seu ofício seguro – a água-tinta. Sutilezas de tonalizações e texturas obtidas com acurada sensibilidade no trato da corrosão pelo ácido nas sucessivas etapas. E quanto à cor, quando é o caso, não se desprende ela da comunhão intrínseca que a expressividade plástica comporta para se totalizar. Percebe-se que, na elaboração de sua gravura, Lêda Watson deixa a complexidade do motivo e a participação dos elementos que o constituirão irem se desenvolvendo num caminhar natural e emotivo, como aquilo que nasce e cresce no terreno fértil da imaginação desembaraçada, apenas colhendo alento na espontaneidade do sentimento que vai sendo estimulado pela própria ação criativa.

Jornal de Letras, Rio de Janeiro, 1975

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